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Obras de Amigos

Dar sem humilhar – Sérgio Vieira de Melo

Em maio daquele ano aquela família passava por grandes privações bem sei. Tudo começou quando Seu Manoel ficou desempregado na gráfica que fechou por conta da chegada dos computadores e demorou a encontrar outro emprego. Com muita dificuldade mantinha em dia luz e água a custa de umas diárias que sua esposa passou a fazer. O plano de saúde nesta situação, nem pensar… Ainda bem que não pagavam aluguel. Ele e a esposa rogavam diariamente em orações ao Criador para que jamais um dos filhos contraísse qualquer doença grave e o casal resignado, nem pensava em si mesmo, o problema maior era com as crianças que vez por outra eram acometidas de gripe, dor de garganta e outros males… E a escola pública logo recebeu mais dois novos alunos. Viviam sob esta constante angústia, Seu Manoel agora precisava arrumar trabalho de qualquer tipo para o pão de cada dia sempre tão escasso e passaram a depender de parentes e pessoas estranhas que se compadeciam da situação vivida por eles.

De início acharam humilhante receber aqueles donativos de comida e roupas usadas, a exposição de suas arguiras, a vergonha dos filhos já adolescentes com as pequenas cestas ditas básicas com as marcas mais baratas, da menor qualidade dos produtos e que não atendia o bastante para uma semana, notadamente os deixavam cabisbaixos e a espera de dias melhores. Mesmo assim não deixavam de contribuir do pouco que tinham com o belo e profícuo trabalho dos irmãos (ãs) da Campanha do Kilo (Orai e vigiai), pois sabiam que ainda existiam famílias em piores situações. Quase sempre optavam por comer só pão se e privarem da alimentação em detrimento dos filhos que estavam em idade de crescimento, pensavam…

– Nós já almoçamos antes de vocês chegarem da escola…

A maioria das pessoas não sabe dar sem humilhar e pensam que qualquer mínimo que fazem é máximo para os outros e quando doam algo se vangloriam com orgulho em busca de reconhecimentos. (Que a mão direita não saiba a quem a mão esquerda ajuda). Aquelas roupas usadas, creio virariam pano de chão ou lixo se não nos fosse doadas. Dizem que em nossa prestação de contas no outro plano, olhando para nossa ficha, seremos perguntados:

– Qual o total em valores que doaste aos necessitados em vida? Em nossos assentamentos aqui conta não mais que R$ 5,25 somados e distribuídos em todos estes teus anos desta existência. É… Fizeste muito pouco, podias ter feito muito mais… Pouquíssima vez incluísse outras pessoas que não os seus em suas orações, não emprestaste teus ouvidos e negaste a palavra amiga na hora mais precisa. Consta aqui também que pediste tanto, deste tão pouco e quase nunca agradeceste.

– Chegará à hora de todos nós sermos julgados e neste plano a moeda que vale é o bem que praticamos e sua conta se apresenta devedora, com tão poucos créditos e esta não foi a primeira vez que tiveste a oportunidade de fazer diferente, resgatar teus erros, ajudar teus semelhantes, crescer e evoluir a caminho do Pai.

Chegou outubro, era o Dia das Crianças, nossa família queria ajudá-los, embora também não possuíssemos tanto. (A quem mais é dado mais será cobrado). Concluímos que o ideal seria uma bola, pois tanto a menina como o menino poderiam brincar… Então disse: – Seu Manoel, minha esposa faz uma macarronada que é uma delícia, mas hoje ela errou na quantidade e colocou todo pacote de macarrão, ainda não almoçamos e gostaríamos de dividir a travessa com vocês, tragam uma vasilha que hoje vocês vão experimentar da macarronada que ela fez e se não gostarem, pode dizer… Essa bola é para a garotada brincar que estão mesmo na idade, né?

– Deus abençoe, te faça feliz e conceda muito mais a vocês. Obrigado mesmo pela ajuda e só Deus pode pagar o que estão fazendo por nós… Penso que aquela simples macarronada, recém saída do forno, naquele dia também reaqueceu os corações daquela família…

A sensação de dar é maior do que a de receber, talvez porque nossa família tem a certeza da máxima: FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO. Assim Seja. Sérgio Vieira de Melo – Bom Jardim PE JUL 17, 2011 – 03h23min.

PS. Acordei na madrugada com uma grande necessidade de registrar estas impressões.

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